sábado, 26 de dezembro de 2009
O QUE É A VIDA?
"Se alguém sabe ser a vida mais do que o absurdo casual e desnecessário situado entre a trombada de um espermatozóide e a pá de cal, por favor, me diga que o sabe e como o sabe".
quinta-feira, 24 de dezembro de 2009
NATAL TODO DIA - TEMPO DE AMOR E PAZ
http://letras.terra.com.br/roupa-nova/1113208/Natal Todo Dia
Roupa Nova
Composição: Mauricio Gaetani Tapajós
Roupa Nova
Composição: Mauricio Gaetani Tapajós
Um clima de sonho se espalha no ar,
Pessoas se olham com brilho no olhar,
A gente já sente chegando o Natal,
É tempo de amor, todo mundo é igual.
Os velhos amigos irão se abraçar,
Os desconhecidos irão se falar,
E quem for criança vai olhar pro céu
Fazendo pedido pro velho Noel
Se a gente é capaz de espalhar alegria,
Se a gente é capaz de toda essa magia,
Eu tenho certeza que a gente podia
Fazer com que fosse Natal todo dia!
Um jeito mais manso de ser e falar,
Mais calma, mais tempo pra gente se dar.
Me diz porque só no Natal é assim?
Que bom se ele nunca tivesse mais fim!
Que o Natal comece no seu coração,
Que seja pra todos, sem ter distinção.
Um gesto, um sorriso, um abraço, o que for,
O melhor presente é sempre o amor.
terça-feira, 15 de dezembro de 2009
sexta-feira, 11 de dezembro de 2009
MEMORIAS DE LEITOR...
Aquela pequena e humilde casa coberta de telha, construída na lateral de um modesto terreno daquela ruazinha no meio do mato, foi testemunha das primeiras aventuras da leitora que um dia seria. As lembranças chegam à minha memória como um turbilhão de emoções. Seus pequenos cômodos serviram-me de refúgio para a aventura das primeiras leituras cujo material, chegava às minhas mãos através da doação de velhas revistas que uma vizinha recolhia do consultório médico em que trabalhava.
O grupo escolar onde estudei foi o local do meu primeiro contato com as letras. Era um lugar mágico que permitia àquela criança inquieta, curiosa e sonhadora dar asas à imaginação e viajar em busca de aventura.
A imagem da minha primeira professora parece-me tão real como se ainda hoje estivesse ao meu lado. Uma jovem de pele muito alva, esguia e bem vestida com seus óculos enormes, que tinham a missão de esconder um rosto belíssimo, ainda coberto de espinhas que denunciava sua pouca idade. Em minhas fantasias de criança, aquela jovem era dotada de poderes especiais. Suas palavras soavam aos meus ouvidos como verdades absolutas, cujo tempo se encarregaria de mostrar como a veracidade das coisas mudam com o nosso amadurecimento.
Minha pequena cartilha, feita de papel jornal, tinha letras pretas enormes, impressas sem nenhuma figura ilustrativa, porém, provocava em mim sensações indescritíveis. Aquele primeiro livro, a que tive acesso, e que tanto representou para minha formação leitora, deu início ao meu processo de letramento.
Nas minhas lembranças mais remotas não me recordo de ninguém lendo, nem mesmo minha professora ou minha mãe, esta mal sabia assinar o próprio nome, fato tão comum aos nordestinos que migram para o sudeste em busca de trabalho e de uma vida melhor. Lembro-me da minha mãe usando provérbios que tinham o poder de ensinamento. Por exemplo, quando eu ou meus irmãos éramos surpreendidos numa mentira ela dizia: “quem se dispõe a mentir sua vergonha não sente, ainda que diga a verdade, todos lhe dizem que mente”. Apesar da sua pouca instrução, minha mãe era uma mulher de profundos conhecimentos, sábia! Devo a ela tudo o que sou; sua presença está tão impregna em mim que se confunde com o ser em que me transformei.
A descoberta da leitura deu-se como mágica em minha vida. Um dia, a menina vivaz e inquieta descobriu-se leitora! A emoção que a leitura proporciona àqueles que a encontra é imensurável.
Hoje, tenho uma necessidade tão grande dos livros que sinto não poder viver sem o seu contato. Eles são tão importantes para minha vida como o ar que respiro.
Ledinalva Colaço da Silva
Maio/2009
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
BILHETE
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
(Mário Quintana)
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
(Mário Quintana)
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
Livros e flores
Teus olhos são meus livros.
Que livro há aí melhor,
Em que melhor se leia
A página do amor?
Flores me são teus lábios.
Onde há mais bela flor,
Em que melhor se beba
O bálsamo do amor?
(Machado de Assis)
Que livro há aí melhor,
Em que melhor se leia
A página do amor?
Flores me são teus lábios.
Onde há mais bela flor,
Em que melhor se beba
O bálsamo do amor?
(Machado de Assis)
sábado, 28 de novembro de 2009
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
domingo, 15 de novembro de 2009
O ignorante político
O pior analfabeto
não é quem não sabe ler e escrever,
que se guia pelas cores dos ônibus,
que não frequenta uma escola,
e escreve o nome com sua digital.
O pior analfabeto
É o analfabeto politico
Ele não ouve,
não fala,não vê
nem quer saber
nem participa da vida que lhe cerca
nem dos acontecimentos políticos
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão,
do peixe,
da farinha, do aluguel,
do sapato e do remédio
inclusive a educação
dependem das decisões políticas
O analfabeto político é tão burro
que se orgulha e estufa o peito,dizendo que odeia política
Não sabe que da sua ignorância política,
nasce a corrupção,
a universidade sucateada,
o menor abandonado, o assaltante
e o pior de todos os bandidos:
que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto
e o lacaio das empresas nacionais e multinacionas
e os bajuladores da ordem que matam de bala ou de fome.
(Adaptado de um texto de B.B)
não é quem não sabe ler e escrever,
que se guia pelas cores dos ônibus,
que não frequenta uma escola,
e escreve o nome com sua digital.
O pior analfabeto
É o analfabeto politico
Ele não ouve,
não fala,não vê
nem quer saber
nem participa da vida que lhe cerca
nem dos acontecimentos políticos
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão,
do peixe,
da farinha, do aluguel,
do sapato e do remédio
inclusive a educação
dependem das decisões políticas
O analfabeto político é tão burro
que se orgulha e estufa o peito,dizendo que odeia política
Não sabe que da sua ignorância política,
nasce a corrupção,
a universidade sucateada,
o menor abandonado, o assaltante
e o pior de todos os bandidos:
que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto
e o lacaio das empresas nacionais e multinacionas
e os bajuladores da ordem que matam de bala ou de fome.
(Adaptado de um texto de B.B)
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
A palavra mágica
Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.
Carlos Drummond de Andrade
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.
Carlos Drummond de Andrade
domingo, 1 de novembro de 2009
Ler devia ser proibido
«A pensar fundo na questão, eu diria que ler devia ser proibido.
Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda os homens para realidades impossíveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem. A leitura induz à loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. Não me deixam mentir os exemplos de Dom Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado, de tanto ler aventuras de cavalheiros que jamais existiram meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre Rocinante. Quanto à pobre Emma Bovary, tomou-se esposa inútil para fofocas e bordados, perdendo-se em delírios sobre bailes e amores cortesãos.
Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolável. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhões que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito à realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquecê-la com cabriolas da imaginação.
Sem ler, o homem jamais saberia a extensão do prazer. Não experimentaria nunca o sumo Bem de Aristóteles: o conhecer. Mas para que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita é apenas executar ordens? Se o que deve, enfim, é fazer o que dele esperam e nada mais?
Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem, necessariamente, ser longos. Ler pode gerar a invenção. Pode estimular a imaginação de forma a levar o ser humano além do que lhe é devido.
Além disso, os livros estimulam o sonho, a imaginação, a fantasia. Nos transportam a paraísos misteriosos, nos fazem enxergar unicórnios azuis e palácios de cristal. Nos fazem acreditar que a vida é mais do que um punhado de pó em movimento. Que há algo a descobrir. Há horizontes para além das montanhas, há estrelas por trás das nuvens. Estrelas jamais percebidas. É preciso desconfiar desse pendor para o absurdo que nos impede de aceitar nossas realidades cruas.
Não, não dêem mais livros às escolas. Pais, não leiam para os seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente. Antes estivesse ainda a passear de quatro patas, sem noção de progresso e civilização, mas tampouco sem conhecer guerras, destruição, violência. Professores, não contem histórias, pode estimular uma curiosidade indesejável em seres que a vida destinou para a repetição e para o trabalho duro.
Ler pode ser um problema, pode gerar seres humanos conscientes demais dos seus direitos políticos em um mundo administrado, onde ser livre não passa de uma ficção sem nenhuma verossimilhança. Seria impossível controlar e organizar a sociedade se todos os seres humanos soubessem o que desejam. Se todos se pusessem a articular bem suas demandas, a fincar sua posição no mundo, a fazer dos discursos os instrumentos de conquista de sua liberdade.
O mundo já vai por um bom caminho. Cada vez mais as pessoas lêem por razões utilitárias: para compreender formulários, contratos, bulas de remédio, projetos, manuais etc. Observe as filas, um dos pequenos cancros da civilização contemporânea. Bastaria um livro para que todos se vissem magicamente transportados para outras dimensões, menos incômodas. E esse o tapete mágico, o pó de pirlimpimpim, a máquina do tempo. Para o homem que lê, não há fronteiras, não há cortes, prisões tampouco. O que é mais subversivo do que a leitura?
É preciso compreender que ler para se enriquecer culturalmente ou para se divertir deve ser um privilégio concedido apenas a alguns, jamais àqueles que desenvolvem trabalhos práticos ou manuais. Seja em filas, em metros, ou no silêncio da alcova… Ler deve ser coisa rara, não para qualquer um.
Afinal de contas, a leitura é um poder, e o poder é para poucos.
Para obedecer não é preciso enxergar, o silêncio é a linguagem da submissão. Para executar ordens, a palavra é inútil.
Além disso, a leitura promove a comunicação de dores e alegrias, tantos outros sentimentos… A leitura é obscena. Expõe o íntimo, torna coletivo o individual e público, o secreto, o próprio. A leitura ameaça os indivíduos, porque os faz identificar sua história a outras histórias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida.
“Ler pode tornar o homem perigosamente humano.»
Guiomar de Grammom
Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda os homens para realidades impossíveis, tornando-os incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem. A leitura induz à loucura, desloca o homem do humilde lugar que lhe fora destinado no corpo social. Não me deixam mentir os exemplos de Dom Quixote e Madame Bovary. O primeiro, coitado, de tanto ler aventuras de cavalheiros que jamais existiram meteu-se pelo mundo afora, a crer-se capaz de reformar o mundo, quilha de ossos que mal sustinha a si e ao pobre Rocinante. Quanto à pobre Emma Bovary, tomou-se esposa inútil para fofocas e bordados, perdendo-se em delírios sobre bailes e amores cortesãos.
Ler realmente não faz bem. A criança que lê pode se tornar um adulto perigoso, inconformado com os problemas do mundo, induzido a crer que tudo pode ser de outra forma. Afinal de contas, a leitura desenvolve um poder incontrolável. Liberta o homem excessivamente. Sem a leitura, ele morreria feliz, ignorante dos grilhões que o encerram. Sem a leitura, ainda, estaria mais afeito à realidade quotidiana, se dedicaria ao trabalho com afinco, sem procurar enriquecê-la com cabriolas da imaginação.
Sem ler, o homem jamais saberia a extensão do prazer. Não experimentaria nunca o sumo Bem de Aristóteles: o conhecer. Mas para que conhecer se, na maior parte dos casos, o que necessita é apenas executar ordens? Se o que deve, enfim, é fazer o que dele esperam e nada mais?
Ler pode provocar o inesperado. Pode fazer com que o homem crie atalhos para caminhos que devem, necessariamente, ser longos. Ler pode gerar a invenção. Pode estimular a imaginação de forma a levar o ser humano além do que lhe é devido.
Além disso, os livros estimulam o sonho, a imaginação, a fantasia. Nos transportam a paraísos misteriosos, nos fazem enxergar unicórnios azuis e palácios de cristal. Nos fazem acreditar que a vida é mais do que um punhado de pó em movimento. Que há algo a descobrir. Há horizontes para além das montanhas, há estrelas por trás das nuvens. Estrelas jamais percebidas. É preciso desconfiar desse pendor para o absurdo que nos impede de aceitar nossas realidades cruas.
Não, não dêem mais livros às escolas. Pais, não leiam para os seus filhos, pode levá-los a desenvolver esse gosto pela aventura e pela descoberta que fez do homem um animal diferente. Antes estivesse ainda a passear de quatro patas, sem noção de progresso e civilização, mas tampouco sem conhecer guerras, destruição, violência. Professores, não contem histórias, pode estimular uma curiosidade indesejável em seres que a vida destinou para a repetição e para o trabalho duro.
Ler pode ser um problema, pode gerar seres humanos conscientes demais dos seus direitos políticos em um mundo administrado, onde ser livre não passa de uma ficção sem nenhuma verossimilhança. Seria impossível controlar e organizar a sociedade se todos os seres humanos soubessem o que desejam. Se todos se pusessem a articular bem suas demandas, a fincar sua posição no mundo, a fazer dos discursos os instrumentos de conquista de sua liberdade.
O mundo já vai por um bom caminho. Cada vez mais as pessoas lêem por razões utilitárias: para compreender formulários, contratos, bulas de remédio, projetos, manuais etc. Observe as filas, um dos pequenos cancros da civilização contemporânea. Bastaria um livro para que todos se vissem magicamente transportados para outras dimensões, menos incômodas. E esse o tapete mágico, o pó de pirlimpimpim, a máquina do tempo. Para o homem que lê, não há fronteiras, não há cortes, prisões tampouco. O que é mais subversivo do que a leitura?
É preciso compreender que ler para se enriquecer culturalmente ou para se divertir deve ser um privilégio concedido apenas a alguns, jamais àqueles que desenvolvem trabalhos práticos ou manuais. Seja em filas, em metros, ou no silêncio da alcova… Ler deve ser coisa rara, não para qualquer um.
Afinal de contas, a leitura é um poder, e o poder é para poucos.
Para obedecer não é preciso enxergar, o silêncio é a linguagem da submissão. Para executar ordens, a palavra é inútil.
Além disso, a leitura promove a comunicação de dores e alegrias, tantos outros sentimentos… A leitura é obscena. Expõe o íntimo, torna coletivo o individual e público, o secreto, o próprio. A leitura ameaça os indivíduos, porque os faz identificar sua história a outras histórias. Torna-os capazes de compreender e aceitar o mundo do Outro. Sim, a leitura devia ser proibida.
“Ler pode tornar o homem perigosamente humano.»
Guiomar de Grammom
OUTUBRO DE 2002 - Trecho do Livro: Calendário do Poder
Não se pense que javé se lançou à obra da Criação com os próprios braços. Deitado eternamente em berço esplêndido incumbiu serafins e querubins de executarem o projeto América Latina. Animados, os anjos puseram mãos à obra, convencidos de que da prancheta do Grande Arquiteto resultaria o melhor.
Lá pelas tantas os serafins estranharam pequenos erros de cálculo. Ora, não fora tudo previsto pela Infinita Sabedoria? Perante desajustes evidentes, alguns anjos relaxaram no trabalho: aos olhos dos arcanjos, pareceu boicote ao projeto.
Bom patrão, Javé dispôs-se a dialogar com os relapsos:
- Por que têm faltado ao trabalho?
- Porque o projeto não é justo respondeu o líder dos serafins.
- Como não é justo? Espantou-se o Sumamente Justo.
- Veja Senhor – argumentou o anjo, o México é proporcional à Argentina: a Nicarágua à Bolívia: o Panamá ao Uruguai. Mas há um país demasiado grande na América do Sul. Por que não dividi-lo em cinco ou seis, e evitar no futuro queixas de que o Senhor privilegiou o Brasil?
Irritado por duvidarem de sua imparcialidade, Javé reagiu:
- Sei muito bem o que faço. E ordenou: Prossigam a obra.
Dias depois, Javé viu a sua Infinita Paciência abalada pela notícia de que os querubins, mais politizados, organizados no sindicato angélico, haviam entrado em greve. Sem temer afrontas, compareceu à assembléia da categoria:
- Por todos os santos, qual é a reclamação agora?
- Os serafins têm razão, Senhor – explicou o líder. – O projeto é realmente injusto. Não podemos prossegui-lo.
- Ora, o que há de errado em criar países com dimensões distintas? Retrucou Javé. – A um continente quadriculado, prefiro a diversidade, como fiz com as espécies de vida.
- Não se trata de proporcionalidade territorial – disse o anjo. – Preocupam-nos os fenômenos naturais destinados a cada país. – Veja Senhor: há desertos no Chile, no Peru e no México; no Brasil, nenhum. Vulcões na Nicarágua e furacões em Cuba: no Brasil, nenhum. Terremotos no Peru, na Guatemala, na Nicarágua, em El Salvador e no México; no Brasil, nenhum. Neve e geleiras em toda a região andina; no Brasil, apenas um neviscar, três noites por ano em São Joaquim (SC), para atrair turistas.
Outro completou:
- Nós da direção sindical, desconfiamos que, após o fracasso do Èden, o Senhor nutre a intenção de reeditar o Paraíso no Brasil.
- Valha-me Deus! - Exclamou Javé. - Expliquem melhor.
- O Èden não faliu por causa de uma maldita árvore? Entre os países, o Brasil é dos raros com nome de vegetal. Dadas as suas dimensões continentais, a ausência de qualquer catástrofe natural e os imensos recursos a ele reservados, concluímos que o Senhor pretende reinaugurar ali o Paraíso, não é verdade? Ou como explicar o projeto de conferir ao Brasil um excelente clima tropical; a maior bacia hidrográfica do mundo; oito mil quilômetros de costa; uma floresta que absorverá boa parte do dióxido de carbono da atmosfera; mais de 600 milhões de hectares cultiváveis e potencial para três safras por ano?
Javé cofiou a longa barba e admitiu:
- Sim, confesso, tive a intenção de abençoar o Brasil de modo especial. Mas sei, por minha onisciência, que lá, por muitos anos, não será o Paraíso. Esperem só pra ver que tipo de políticos aquela gente haverá de eleger. O estrago, ao menos nos primeiros séculos após a chegada de Cabral, será muito grande: haverá miséria, desigualdade, discriminação, corrupção e violência. Crianças abandonadas andarão ameaçadoras pelas ruas e agricultores ficarão à beira de rodovias à espera de um pedaço de terra. Como não perco a esperança, pode ser que, um dia, os eleitores descubram que, ao votarem a favor da justiça social, o Brasil estará muito perto se vir a ser um Paraíso.
Frei Beto
sábado, 31 de outubro de 2009
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
Canção do Exílio
"Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá."
Gonçalves Dias
domingo, 20 de setembro de 2009
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